24.2.07

O Estado-razão III

Para o grande sociólogo francês existiria uma consciência colectiva, a qual, em lugar de resultar das consciências individuais, é que produziria estas últimas: tudo o que existe na consciência individual deve ser atribuído à pressão social e a única liberdade do indivíduo é a de individualizar em si a consciência colectiva.
E isto porque a sociedade não se reduz a uma simples soma de indivíduos, mas o sistema em que se traduz a respectiva associação e que representa uma realidade específica, dotada de características próprias.
Enquanto os contra‑revolucionários Bonald (1754-1840) e Maistre (1753-1821) adoptavam um organicismo tradicionalista que exigia a identidade entre o órgão e a função, em nome do princípio da divisão do trabalho, Durkheim, pelo contrário, vem considerar que as estruturas da sociedade podem mudar de função e que uma dinâmica divisão do trabalho implica o aparecimento de novas estruturas e, consequentemente, de novas formas de poder.
Como ele próprio assinala, quanto mais as sociedades se desenvolvem, mais o Estado se desenvolve; as suas funções tornam‑se cada vez mais numerosas, penetram, além disso, todas as outras funções sociais que o mesmo concentra e unifica por isso mesmo. Os progressos da centralização são paralelos aos da civilização.
Assim, refere que o Estado estende progressivamente sobre toda a superfície do território uma rede cada vez mais apertada e complexa de ramificações que se substituem aos órgãos locais pré‑existentes ou os assimilam.
Num conúbio entre Weber e Marx, também Jürgen Habermas considera que o Estado Moderno, que se forma em conexão com o tráfico mercantil das economias territoriais e nacionais em formação a partir das necessidades de uma administração financeira central, viu‑se sempre remetido para a competência profissional de funcionários com preparação jurídica.
Isto é, para além de exércitos permanentes, surgiu uma administração permanente e tiveram de aplicar mais uma arte do que uma ciência.
O Estado resultaria da emergência das sociedades das chamadas culturas superiores (civilizations), em oposição às sociedades ditas mais primitivas, através de três elementos:
- existência de um poder central ( organização estatal da dominação face à organização por parentesco);
- divisão da sociedade em classes socio‑económicas
- estar em vigor algum tipo de mundivivência central (mito, religião superior) que tem como fim uma legitimação eficaz da dominação.
Acontece que o Estado parece ter de abandonar a substância da dominação em favor de uma inserção eficiente das técnicas disponíveis no enquadramento das estratégias impostas pelas próprias coisas ‑ ele parece já não continuar a ser um aparelho para a imposição coactiva de interesses infundamentáveis por princípio e só sustentáveis em termos decisionistas, para se transformar num órgão de uma administração integralmente racional.